Uma menina nasceu sabendo.
Já tinha a certeza de tudo que a aconteceria.
Já se preparava pras dores físicas.
Já se preparava pras dores da alma.
Já se preparava pra tudo.
Já sabia suas alegrias e suas tristezas.
O porque iria chorar daqui dez dias
Ou porque iria chorar de alegria daqui dez dias.
Achava isso tudo magnífico.
O seu conforto já era existente e permanente.
Tinha a sua defesa contra todos os tropeços.
Mas também achava patético.
Patético, frustrante e sem graça.
Acordava sem sorrir e dormia sem sorrir,
uma vez que já sabia os desdobramentos de cada sorriso.
Uma outra menina nasceu não sabendo.
Era pega de surpresa pra cada dor física.
Era quase pega de surpresa pra cada dor da alma.
Não tinha certeza de nada.
Suas alegrias eram únicas. Cada vez mais alegres.
Cada vez mais sorrisos.
Cada vez mais expectativas.
Cada vez mais insegura.
E achava isso maravilhoso.
O gosto da novidade e das coisas inesperadas era cada vez mais saboroso.
Mas também achava patético.
Patético, frustrante e sem graça.
A ansiedade dilacerava toda e qualquer sensação.
O medo percorria cada veia de seu corpo. O medo a corroía por dentro.
O medo do que está por vir.
O medo do que não deveria vir.
O medo do que vem.
O medo de tudo de bom acabar.
O medo de todos bons irem embora.
O medo sem fim.
A inquietação sem fim.
As duas meninas um dia se encontraram.
Uma já sabia, a outra nem imaginava.
E então, viram a beleza da outra.
Viram a sua própria beleza na outra também.
Desde então, continuaram a se encontrar.
Assim como um aprendizado,
os encontros nunca cessaram,
as diferenças se encaixaram formando o completo mais completo.
E dizem que esse completo ainda anda por aí.
E enfeitiça todo mundo.
E adoece todo mundo.
E alegra todo mundo.
E entristece todo mundo.
E surpreende todo mundo.
Todo mundo.
Mundo.
marília bilu.